Homenagem a Antunes Filho

Samea Ghandour e Antunes Filho

Samea Ghandour*


Antunes Filho era fogo. Dizia e desdizia só pra fazer a pessoa refletir. Ele tirava as suas certezas, o seu chão. Se você desse o seu melhor numa cena para ele, certamente ele diria que estava péssimo, uma porcaria, daí pra baixo.


E depois ele elogiava algum outro trabalho um pouco mais fraco só pra outra pessoa ficar com raiva e dar mais o sangue. Antunes Filho era fogo.


Mas, de vez em quando, também era riso, fluxo e leveza, quando explicava pra gente como fazer uma cena. Ele simplesmente subia no tablado e falava: "é assim, ó, tá vendo, menina? Respira... daí fulano vem... fala comigo, diz que me ama pra caramba, mas que não pode ir pra cama comigo, aí você responde... isso... agora esconde o jogo...".


Ele sabia ser didático quando estava com paciência. Mas na maioria das vezes era um sujeito mais variegado que Odisseu. Tanto que não dava pra captar o jogo dele. Eu tento entendê-lo até hoje, cinco anos depois do CPTzinho, e vira e mexe ele me vem à cabeça mesmo quando não estou pensando em teatro.


Ontem mesmo estava tendo uma conversa imaginária com ele sem saber que ele tinha ido embora. Antunes Filho era fogo. E sua centelha vai arder em mim pra sempre. Gratidão, Mestre! Boa viagem!



*Samea Ghandour é mestranda em Letras Clássicas pela USP. Pesquisa na área de Teatro do Período Helenístico com enfoque em formas dramáticas populares e literárias. Bacharela em Letras com habilitação em Grego e Português e licenciada em Português pela Universidade de São Paulo. Participa do grupo de pesquisa Estudos sobre Teatro Antigo pelo CNPq e do grupo de pesquisa Hellenistica, ambos na FFLCH/USP. Em 2014, frequentou o curso de Iniciação ao Método do Ator, no Centro de Pesquisa Teatral (CPT), no Sesc Consolação, em São Paulo.