AGENDA PÓS-CARNAVAL 2023 - PARTE 1
ILÍADA,
de Homero
Tradução: Manuel Odorico Mendes
Direção:
Octavio Camargo (Cia. Ilíadahomero de Teatro)
Elenco:
Daniel Dantas; Letícia Sabatella
Local: Teatro
XP – Rio de Janeiro
Temporada: 3
mar. – 2 abr. 2023
Duração: 70
min.
Ingressos
Sinopse
Dois momentos da poesia heroica sobre a Guerra de Troia são encenados pelos atores Daniel Dantas e Letícia Sabatella, o Canto I, com o estabelecimento do conflito interno entre os gregos
e suas motivações, e o Canto XX, com o retorno triunfal e implacável do herói
Aquiles ao campo de batalha. Considerada a obra fundadora do pensamento ocidental, a Ilíada, de Homero, narra o último dos dez anos de combate entre
Grécia e Troia. (divulgação)
O que você precisa saber antes
Não se trata de uma “montagem teatral” no sentido estrito, ou seja, não são vários atuantes desempenhando diferentes papéis com cenografia que reproduza o palco da mítica guerra entre povos da Hélade e troianos.
Não se trata de uma montagem inédita, ainda que cada apresentação seja única, como sabem todos que frequentam o teatro. É possível assistir a um registro audiovisual do espetáculo realizado em 17 de julho de 2022 no 32º Festival de Inverno da UFPR.
O vídeo é mais extenso (1:28:44) do que a duração do espetáculo porque conta, até os 25 minutos iniciais, com uma introdução feita por Octavio Camargo, diretor da montagem e da Cia.Ilíadahomero de Teatro, fundada em 1999 em Curitiba (PR). O projeto é mais ambicioso, muitos de nós sabemos: o pacote completo inclui a performance dos 24 cantos do poema épico atribuído a Homero, um aedo que cantaria os versos hexamétricos lá no século VIII antes da Era Comum.
Se sua paciência para a tela não é muita, sugiro dar uma olhada rápida no discurso do ancião Nestor (Canto I, versos 254-284) iniciando aos 43:00. Na tradução de Odorico Mendes:
Oh, que júbilo a Príamo e a seus filhos!
Folgue Ílio à nova que assim litigam
Os de mor pulso e tino. Obedecei-me,
Sou velho, ó moços. Tido em boa conta
Com melhor que vós me dava outrora.
Varões vi nunca, nem verei, qual Drias
Das gentes regedor, Ceneu e Exádio,
Um Pirítoo, um divo Polifemo,
Teseu Egides a imortais parelho.
Outros como esses não nutria a terra:
Feros pugnaram trucidando a feros
Montículas Centauros. Lá de Pilos,
Da Ápia eu vinha rogado; conversava-os,
Quando era em mim nas lutas me exercia.
Ninguém dos vivos de hoje os contrastara;
Atendiam contudo aos meus conselhos:
Atendê-los vos praza. Ao mais estrênuo
Tu não tomes dos nossos a só paga;
Nem de ao rei contravir, Pelides, cures;
Dos eleitos que Júpiter estima,
Cetrígero nenhum se lhe equipara:
Mãe deusa te gerou, valor te sobra;
Tem ele mais poder, que impera em muitos.
Eu to suplico, Atrida, a fúria amaina,
Sê brando para quem nesta árdua empresa
É baluarte e escudo aos Gregos todos.”
Outra sugestão é ir direto para Letícia Sabatella (1:04:25), que faz a performance desde 2016. Mais uma “Global” que se engajou no projeto é Guta Stresser, encarregada do Canto 9.
A
participação de Daniel Dantas é que é mais recente, mas não inédita. Entre 11 e
19 de dezembro de 2021, na retomada dos teatros após a pandemia de covid-19,
ele apresentou seu Canto I no Teatro Petra Gold, no Rio, com duração de 60
minutos. Encarregada da abertura da Ilíada anteriormente era a
atriz Claudete Pereira Jorge, que havia estreado o Canto I em 2007 na 1ª Bienal
de Arte Contemporânea de Tessalônica. Ela faleceu em 2016. Se você quiser fazer
aquela coisa mesquinha da comparação, aqui tem uma apresentação da artista em 2011.
(Eu, a mesquinha, constatei que o discurso que DD profere em 2 minutos,
Claudete fazia em 4.) Sobre sua adesão ao texto épico em português do
século XIX, Daniel Dantas comenta o seguinte:
“Eu entrei em um projeto
que já existia, e fiquei apaixonado pela linguagem, não só do Homero, mas pela
linguagem específica do Odorico (1799-1864), nosso tradutor. E meio de
brincadeira eu comecei a decorar, a conversar, e ficamos amigos eu e o Octavio,
o diretor da companhia. [...] Eu acho fundamental que a gente repita e insista
fazendo coisas que às vezes não são tão fáceis, porque eu acho que é um pouco
isso que a arte pode oferecer, buscar dar à plateia o que ela quer e o que ela
ainda não quer, aquilo que ela vai aprendendo a gostar”. (divulgação)
Eu acho que tem mérito isso! Certamente, popular não é. Trata-se de engajamento com uma proposta estética, um compromisso de formação de público, reconhecimento da produção cultural que vem também da tradução.
Outras formas de tradução da Ilíada enriquecem seu repertório. Vem comigo:
Em 2015, o ator Bruce Gomlevsky fez um espetáculo, digamos, solo (na verdade, acompanhado da contrabaixista Alana Alberg), chamado “Uma Ilíada”, tradução de Geraldo Carneiro para o texto An Iliad (2014) de Lisa Peterson e Denis O’Hare. Estreou no Rio de Janeiro em 2015 e foi para São Paulo em 2016, onde eu vi, mas sobre o qual não escrevi porque o blog ainda não existia. A “Revista e”, do Sesc São Paulo, tem um registro escrito. Um registro audiovisual do espetáculo, sem identificação de data, aqui.
Eu também adoro ver de novo e de novo este projeto (Sesc mais uma vez!), que teve como consultor o professor André Malta (USP): Ilíada + Odisseia / ritmo + poesia (2009/2016).
MC Max B.O. e o DJ Babão põem música no Canto I e em outros. Rolou um show de lançamento em 2018, mas infelizmente eu não vi, só escrevi. AH, SIM, BOM CARNAVAL!
Excelente texto!
ResponderExcluir