ODISSEIA da Cia. Hiato – outra vez, de novo...
Mito: Odisseu
Dramaturgia: escrita a partir da “Odisseia”, de Homero, por Aline Filócomo, Aura Cunha, Fernanda Stefanski, Leonardo Moreira, Luciana Paes, Maria Amélia Farah, Paula Picarelli e Thiago Amaral.
Temporada: 09.06 a 08.07.18
Local: Sesc Paulista | São Paulo (SP)
Dramaturgista: Mariana Delfini
Direção: Leonardo Moreira
Elenco: Aline Filócomo, Aura Cunha, Fernanda Stefanski, Luciana Paes, Maria Amélia Farah, Paula Picarelli e Thiago Amaral.
Duração: 270 min.
Assistido pela SEGUNDA VEZ em: 23.06.18
Não, eu não me cansei e decidi ver de novo as quatro horas e meia da “Odisseia” da Cia. Hiato no Sesc Paulista, cuja temporada se encerra em 8 de julho e tem ingressos esgotados (mas recomendo ter a paciência de esperar por lugares vagos).
Nesta segunda vez que assisti ao espetáculo, com duas semanas de intervalo desde a surpresa inicial com cada uma das performances na estreia, alcancei uma visão de conjunto em que o poder curativo da ação de narrar é o instrumento do recontar a história de Odisseu como herói – ou melhor, “des-herói”.
O Odisseu da Cia. Hiato é motivo de indignação: é o pai que abandona os filhos para Telêmaco, o amante que alimenta falsas ilusões para Calipso, o homem focado no instinto animal para Circe, a máquina de matar que vacila para Atena, aquele que não pertence a lugar algum para Penélope.
“Eu queria ser Clitemnestra!”, diz Penélope (Aline Filócomo) numa gravação que ouvimos em cena. Todas as mulheres que fazem ali suas performances – mesmo nos papéis de Telêmaco (Aura Cunha), Calipso (Luciana Paes), Circe (Maria Amélia Farah) e Atena (Paula Picarelli) – querem ser Clitemnestra, a “virago”, a mulher com traços de virilidade, a que não aceita nem se sujeita. Ela não é pautada pela vingança, mas pela tentativa de, ao menos, reagir à rejeição.
Como afirma a dramaturgista Mariana Delfini, esta “Odisseia” olha para o avesso da trajetória do herói, olha para os que estão presos a paixões: “Talvez, por isso, uma outra narrativa de processo precise ser cantada; uma que exalte menos a superação e acolha os nossos medos, desvios, baixezas, frustrações e rejeições, a obsessão, a dificuldade de abandonar, de construir” (Divulgação).
E, de novo, como eu já disse no post anterior, cada um de nós na plateia deve ser esse Odisseu colocado em xeque. Na arena e na plateia, espera-se que todos abram mão de serem míticos heróis e sejam apenas gente.
O desfecho da montagem da Cia. Hiato trata da finitude, do que tempo que tudo apaga, trata de como, em três minutos, aquela peça já terá sido passado. Sim, a peça, sim. Mas a “Odisseia” – aquela – já provou que veio para ficar. (Renata Cazarini)