ENSAIOS NO PARÁ: ANTÍGONA NA AMAZÔNIA

 

A trupe do teatro Gent, da cidade belga de mesmo nome, está na Amazônia para encenar o massacre de Eldorado dos Carajás (PA) em 17 de abril, dia nacional de luta pela reforma agrária. Antígona na Amazônia é o projeto que conclui a trilogia do encenador e dramaturgo Milo Rau sobre a mitologia antiga, depois de Orestes em Mosul e O novo evangelho. É uma peça, mas também um evento político e uma ação social, daí o conceito de projeto.

Antígona na Amazônia estreará em 17 de abril de 2023 em uma ocupação em uma rodovia federal que corta a Amazônia, no dia e local do massacre. A estreia europeia será em 13 de maio de 2023 no NTGent (Gante, Bélgica), conduzida pelo diretor artístico Milo Rau. Paralelamente à peça, uma campanha para salvar a Amazônia está sendo desenvolvida em conjunto com o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra e muitas outras ONGs. (divulgação)

(material da imprensa em português)


A expectativa em torno dessa montagem foi nutrida pelo adiamento causado pela pandemia de covid-19. A editora internacional do blog “The Stage”, Natasha Tripney, está apostando na montagem de Milo Rau como uma das mais comentadas da temporada 2023 na Europa: “Ele é um dos artistas de teatro mais interessantes da atualidade e vai despertar muita atenção. Ele vai lidar com muitas perguntas que nos fazemos sobre a catástrofe climática, sobre o populismo – obviamente, eles começaram o projeto quando Bolsonaro ainda estava no poder”.

A peça já está na programação do mais prestigiado festival de teatro da Europa, o Festival d’Avignon, na França. Será encenada entre 16 e 24 de julho de 2023, com duração de duas horas, falada em português, tucano, inglês, francês e flamengo, com legendas em francês e em inglês.


Na tela, o coro canta sua trágica canção. Uma canção que é uma diatribe formidável contra os protagonistas no palco. Cenas filmadas e sequências ao vivo respondem umas às outras; o diálogo é eloquente. Estamos ao mesmo tempo no coração da mítica Tebas e no estado do Pará onde a selva amazônica brasileira está se desintegrando, saqueada e irremediavelmente destruída por grandes grupos industriais. E é nesse solo exangue que Milo Rau reuniu atores brasileiros e europeus, músicos, ativistas indígenas e integrantes do Movimento dos Sem Terra (MST). E é com a sua experiência e conhecimento, somados à nossa cultura greco-romana, que o encenador suíço, diretor do NTGent e diretor designado do Wiener Festwochen, fecha a sua “Trilogia da Antiguidade” e revive a tragédia de Antígona. Uma Antígona encarnada pela ativista indígena amazônica Kay Sara ao lado de um coro antigo formado por sobreviventes do pior massacre da polícia militar contra o MST, em 1996.

(divulgação Festival d’Avignon)


Frederico Araújo, no Pará

Hemon, Creonte, Ismênia e Eurídice são interpretados alternadamente pelos atores belgas Arne De Tremerie e Sara De Bosschere e o brasileiro Frederico Araújo, que faz o Guarda e o Mensageiro: “Eu tenho um papel meio de comentador e narrador” – ele falou ao blog.


Zé Celso na gravação em SP, com Milo Rau

Em São Paulo, Zé Celso Martinez Corrêa gravou como Tirésias no topo de um prédio no final de março. Em abril, em Marabá (PA), a trupe grava as cenas que serão exibidas na peça, incluindo um Coro de militantes do MST.

Os diálogos de embate entre Antígona e Creonte, bem como as passagens do Coro, que têm sido reinterpretadas por 2.500 anos, serão ressignificadas em oficinas junto com ativistas do MST e atores do Brasil e da Europa. É um choque da ordem mundial liberal com a cosmologia holística dos povos indígenas do Brasil, que na era do colapso climático iminente estão cultivando uma abordagem da natureza voltada para o futuro.

(divulgação)

Sobre Milo Rau e seus projetos, leia posts anteriores aqui e aqui.


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