ACTÉON (1684)
ACTÉON (1684)
Compositor: Marc-Antoine
Charpentier (1643-1704)
Ópera pastoral transformada em tragédie en musique a
partir de uma passagem das Metamorfoses de Ovídio
Direção cênica e dramaturgia: Leonardo Ventura
Direção musical e regência ao violino: Juliano Buosi
Regente titular do Coro Lírico: Mário Zaccaro
Elenco: Jabez Lima (Actéon), Marília Vargas (Diana), Keila de
Moraes (Juno), Ludmila de Carvalho (Daphné), Elaine Morais (Hyale), Walter
Fawcett (Caçador 1), Daniel Lee (Caçador 2)
Participação de Morgana Manfrin (Atriz)
Coro Lírico Municipal
Músicos: Marcus Held, Octavio Amado,
Vitor Tamarindo (primeiros violinos); Raquel Aranha, Letizia Roa, Samara Gama
(segundos violinos); Paulo da Mata, Lívia Lanfranchi (traversos); Natalia Chahin,
Vinícius Chiaroni (oboés barrocos); Romeu Rabelo (fagote barroco); Isabel Kanji
(cravo); Guilherme de Camargo (teorba); João Guilherme Figueiredo (violoncelo);
Iara Ungarelli (viola da gamba).
Cenografia: Chris Aizner
Desenho de luz: Silviane Ticher
Assistência de direção: Aelson Lima
Fotos: Rafael Salvador
Tradução do libreto original: Alexandre Agabiti
Sala do Conservatório – Praça das Artes – Complexo do TMSP
Projeto Ópera Fora da Caixa
Temporada: 3 a 5 ago. 2022, 20h00
Assistido em 4 ago. 2022
60 min.
N.B.
Escrita
no final do século XVII, assim como as demais óperas da época, Actéon
tinha o acompanhamento de uma
orquestra de conformação um pouco diferente da que conhecemos hoje. Não só pela
configuração do palco e os instrumentos utilizados, mas também pela maneira de
tocá-los. Para essa montagem fazer jus ao que acontecia no período, contamos
com especialistas em violinos, violoncelos, cravo, fagotes e oboés barrocos,
travessos (flautas transversais barrocas) e viola da gamba.
(...)
Uma das peculiaridades no interpretar da música que
podemos ver nesta ópera está na figura de Actéon. Para esse papel, existe uma
tessitura que é praticamente singular à música francesa, o chamado haute contre, que poderíamos traduzir, ao pé da
letra, como contralto, mas que na realidade é como um tenor muito leve, uma
tessitura muito aguda, única. (divulgação)
Sinopse
Marc-Antoine Charpentier, notório compositor do período barroco, para a criação desta bela ópera pastoral em forma de tragédia musical, se valeu da estrutura desta fábula em que o nobre caçador Actéon adentra os domínios proibidos da deusa Diana – Ártemis, na versão grega, a deusa das florestas, da caça, protetora das fronteiras e instrutora dos limites das transformações –, a flagra se banhando na companhia de suas ninfas, é descoberto por elas e, por sua ousada usurpação, recebe um castigo: é transformado em um cervo e devorado pela ira dos seus cães, que não o reconhecem. (divulgação)
COMENTÁRIO
NÃO se assuste com os “nãos” iniciais neste comentário.
Acontece que não tenho competência para comentar o desempenho de
cantores e instrumentistas, também não tinha assistido antes à ópera Actéon,
daí que eu não tenha parâmetros para comparação. Mas agora vi, e isso
deve valer de algo.
Alguns pressupostos da montagem têm que ser apresentados para contemporizar
o que, mesmo assim, quero destacar: a conturbada movimentação em cena.
O projeto “Ópera Fora da Caixa”, cuja estreia aconteceu com
“Actéon”, tem como meta expandir as encenações operísticas para fora da caixa
cênica do grande palco do Theatro Municial de São Paulo, conforme o programa do
evento: “com montagens em formatos propícios a espaços como a Sala do
Conservatório, as escadarias do Theatro, o Salão Nobre, a Cúpula e, também,
aptas a alçar voos e circular em outros locais”.
A intenção é nobilíssima, até porque se trata de ampliar o
repertório e de fazer novas experimentações cênicas. Mas era gente demais para
espaço de menos e não dá para abrir mão de um recurso essencial como o letreiro
das legendas.
A Sala do Conservatório, espaço convencional de palco
italiano, foi ressignificado com a intenção de integrar o público à cena, como
afirma o diretor musical, Juliano Buosi, no programa distribuído aos
espectadores (baixe a edição digital aqui). Assim, foram instaladas
arquibancadas com cadeiras não numeradas formando um palco central longitudinal,
como o do Teatro Oficina.
Outra proposta, que tenta solucionar a ausência de projeção de
legendas, introduz uma personagem identificada apenas como Atriz, papel da
trans em processo Morgana Manfrin. Ela se encarrega do prólogo, intermezzo e
epílogo, como se um aedo, segundo o programa, insistindo sempre no conceito de
“metamorfose”. Sua presença é marcante, mas não substitui as legendas e, assim,
se via o público a todo tempo consultando o libreto para acompanhar o andamento
da história.
ACTÉON
Meu coração, outrora tão intrépido,
Que medo te domina?
O que vejo neste espelho líquido?
Meu rosto todo enrugado,
Uma barba horrorosa me envolve,
Quase nada resta do meu aspecto original,
Minha palavra não passa de uma voz confusa.
Ah! No estado em que me vejo,
Vós, deuses que me moldastes do nobre sangue
dos reis,
Para poupar-me a vergonha,
Tirai-me a visão.
Cuidamos de, na
encenação, não reduzir o mito a uma leitura contemporânea literal, mas entender
quais caminhos poderiam ser percorridos, sem apagar os limites da fábula e
retirar-lhe suas múltiplas e possíveis leituras. Nossa escolha, então, foi
pontuar uma possível resposta do feminino às tiranias históricas do masculino
(ou do que comumente entendemos por um e outro); um masculino que se apodera de
limites proibidos, um devastador trazendo a um novo território sua ação nefasta
e, finalmente, a resposta irada deste feminino que há tanto é usurpado.
(Leonardo Ventura, direção cênica e dramaturgia)
Renata
Cazarini
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