EPIDEMIA PRATA – DESMONTAGEM


Mito de Medusa (apenas alusão)

Cia. Mugunzá de Teatro

Audiovisual

Duração: 50 min.

Estreia: 4 dez.2020

Disponível no YouTube



COMENTÁRIO

Aproveito a desmontagem do espetáculo Epidemia Prata, que estreou em 23 de maio de 2018, em São Paulo, para retornar ao tema da Medusa. A peça, sobre a qual já escrevi aqui, não narra o mito, apenas alude a ele: “Medusa, me transforma em pedra e me usa”, diz um personagem a certa altura. Instalado na chamada Cracolândia, na cidade de São Paulo, o Teatro de Contêiner, projeto da Cia. Mugunzá de Teatro, abordou nessa peça o que identifica como uma situação de conflito na sua vizinhança, sempre submetida à violência do Estado, e os corpos estendidos no chão e invisibilizados. O estigma sobre esses corpos os petrifica, são gente-estátua, que passa despercebida. Mas o olhar de Medusa também petrifica quem presencia essa situação. É preciso debelar essa condição de vitimado pelo olhar de Medusa para agir. É o que a trupe relata no documentário sobre os bastidores do espetáculo, o processo de sua construção e da superação de sua própria paralisia. Uma personagem, como que antecipando as bolhas plásticas vistas no isolamento, trafega “protegida” entre os moradores da Cracolândia, jovens prateados que buscam prata se apresentando para os motoristas quando o trânsito para. Essa situação já era entendida pela Mugunzá como uma epidemia. Da epidemia para a pandemia, é um pulo. 



A diretora convidada Georgette Fadel refuta que o espetáculo seja “desesperançoso”, mas que o capitalismo é, sim, uma epidemia contra a qual ela não tem esperança. Os artistas vão sendo tomados pela cor prata, manifestação da epidemia, reforçada cenicamente pelas moedas num número sem fim e instrumentos do naipe de metais que atores e atrizes tocam na peça. Recomendo ouvir. Mas prata também é a cor da pedra de crack acesa: “sua luz traz o brilho e a necessidade de ser visto por uma sociedade que ignora determinados guetos”, dizem no material de divulgação. Pode-se ter uma ligeira ideia do que a Cia. Mugunzá chama de “etnografia cênica da vulnerabilidade da região central de São Paulo” neste teaser de Epidemia Prata.


Renata Cazarini


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